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O manuscrito “EVASÃO NOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE QUÍMICA DO BRASIL: ANÁLISE DOS ARTIGOS CIENTÍFICOS” está bem escrito, claro e organizado. Com isso, cumpre todos os requisitos esperados de um trabalho acadêmico do tipo artigo para periódico (define o objetivo, apresenta os métodos, discute os resultados etc.).
Meus únicos comentários – talvez mais reflexões – são pontuais e dizem respeito i) à Tabela 2; ii) à análise cienciométrica.
Sobre i). Achei a apresentação da frequência na Tabela 2 um pouco confusa, pois não está claro o que, de fato, ela representa. Por exemplo, os autores indicam que a categoria “Pouca identificação com o curso” é um motivo para evasão relatado em 43,75% artigos da amostra (i.e., 7 artigos). Outra categoria, como “Evasão devido a motivos pessoais” ocorreu 18,75% (i.e., em 3 dos 16 artigos analisados). Até aqui tudo bem.
O que me causa dúvida é que cada um desses 16 artigos utilizou quantitativos distintos de respondentes para chegar a essas categorias (minha suposição). Isso torna difícil sustentar, como está escrito no parágrafo subsequente à tabela, que “[...] sendo possível observar a existência de oito subcategorias, com prevalência de uma, denominada ‘Pouca identificação como curso’, observada por 43,75% das pesquisas como fato que contribui para evasão dos estudantes”.
A questão é que o fato de uma categoria aparecer mais vezes nos artigos não significa, necessariamente, que ela seja a principal responsável pela evasão dos estudantes, pois o quantitativo de respondentes e a metodologia utilizada por cada artigo da amostra varia. Parece-me que seria necessário algum tipo de análise ponderada, ou ao menos uma discussão reflexiva sobre essa limitação.
Exemplo simplificado que ajuda a ilustrar a situação:
Digamos que, nos 7 artigos nos quais aparece a categoria “Pouca identificação com o curso”, essa categoria tenha sido mencionada por um total de 20 respondentes. Também suponha que a categoria “Evasão devido a motivos pessoais” que aparece em apenas 3 artigos tenha sido mencionada por 30 indivíduos. Nesse caso, mesmo com menor presença nos artigos, esta última categoria poderia representar um fator mais significativo de evasão do que a primeira, mesmo que tenha aparecido menos vezes como categoria nos artigos analisados.
Como esse tipo de dado não parece ter sido apresentado ou discutido no manuscrito, essa ausência acaba gerando dúvida e compromete um pouco a argumentação.
Por fim, no final da página 17 e início da 18 é dito que “[os pesquisadores-autores dos artigos analisados] Apresentam poucos artigos publicados sobre o tema da evasão, o que demonstra a preocupação com os elevados índices de abandono em seus cursos”. A frase me soa estranho. Fiquei em dúvida sobre a lógica da construção. Ter poucos artigos publicados realmente demonstra preocupação com os elevados índices de evasão? Intuitivamente, pareceria indicar o oposto: que há pouca atenção dedicada ao tema. No cenário que houvesse muitos artigos publicados sobre o assunto, isso não indicaria justamente uma preocupação mais efetiva com a evasão? (Concordo sobre sugerir da naturalização do fenômeno mencionado a seguir).
Sobre ii). Os autores destacam logo na primeira sentença do resumo que o presente manuscrito utiliza análise cienciométrica para investigar o tema da evasão em cursos de licenciatura em Química. “Cienciometria” também é indicada como uma das palavras-chave. Isso naturalmente gera certa expectativa no leitor quanto à forma do texto.
Os autores também mencionam o trabalho de Macias-Chapula (1998). Nesse trabalho, Machias-Chapula sintetiza em sua Tabela 1 uma tipologia dos termos bibliometrica, cienciometria e informetria. Ali consta, por exemplo, que rankings, frequências e distribuições são métodos da bibliometria, enquanto a cienciometria se ocupa de análises de conjunto e de correspondência. Sem me estender muito, meu ponto é que, ao longo do manuscrito, a análise apresentada baseia-se exclusivamente em frequências dos elementos observados (e.g., regiões onde as pesquisas foram realizadas, periódicos que publicaram os artigos, categorias das definições de evasão etc.). Embora essa análise seja perfeitamente válida, entendo que ao anunciar o uso da cienciometria conduziria a análises baseadas em leis cienciométricas (e.g., Lotka, Zipf) tal como outros já fizeram na área da Educação em Ciências (ver, entre outros, Barros; Langhi, 2023; Razera, 2016; Santos; Jesus; Silva Junior, 2022). Entendo que a quantidade reduzida de artigos no corpus limita a aplicação de análises cienciométricas com formulações estatísticas além das frequências. Assim, minha sugestão aos autores é reavaliar a pertinência e a necessidade do uso do conceito de cienciometria no manuscrito, e/ou contextualizá-lo dentro dos limites da metodologia e contexto que se desenvolveu a análise.
Em poucas palavras: a análise de frequência feita pelos autores é comum em revisões da literatura na área da Educação em Ciências, e não me parece haver ganhos em nomeá-la como um análise cienciométrica.
Referências
Barros, L. G.; Langhi, R. (2023). Um Estudo Cienciométrico da Pesquisa em Ensino de Ciências Em Espaços Não Formais Em Periódicos Nacionais da Área de Ensino (2008–2019). Investigações em Ensino de Ciências, 28(2), 36-64.
Razera, J. C. C. (2016). A formação de professores em artigos da revista Ciência & Educação (1998–2014): uma revisão cienciométrica. Ciência & Educação (Bauru), 22(3), 561–583.
Santos, C. S.; Jesus, A. M. P.; Silva Junior, J. C. S. (2022). Um Perfil Métrico do ’Ensino de Ciências’ em Artigos da Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (2001–2020). Revista Brasileira De Pesquisa Em Educação Em Ciências, e39411, 1-27.
The author declares that they have no competing interests.
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